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BADOLA

Por: Ademiro Alves (Sacolinha)

 

Ninguém esperava esse ato. Ele nunca se mostrou violento, e em momento algum discutiu com alguém.

Quando ainda estudava, Badola era o adolescente mais bobo da sala de aula, vivia dando risadas e contando piadas sem graça.

Alguns acharam que ele era desequilibrado, vários eram os comentários.

- Esse cara é meio doido das idéias. – Alguém dizia no intervalo.

- Menino trouxa, nem parece que teve infância. – Comentavam as meninas.

Recebeu muitos apelidos: Nerds, Da Lua, Cabeça vazia, Mister Sem-Graça...

Mas nenhum desses pegou. “Badola” já era o seu apelido desde a infância, e não costumava ficar nervoso com os apelidos colocados.

O seu comportamento mudou depois que ele largou os estudos. Começou a passar o dia inteiro em casa e á noite ir pra rua, mesmo que estivesse frio ou chovendo.

Adotou uma maneira estranha de andar; seus passos são curtos e rápidos. O rosto vive voltado para o chão.

Ele parece estar em conflito consigo mesmo.

Essa mudança que foi acontecendo aos poucos, não chamou a atenção da senhora Carraro, mãe de Badola, que acha que o comportamento do filho está relacionado ao irmão mais novo por ele ter um comportamento afeminado, além do próprio Badola estar com 19 anos e nunca ter beijado a boca de uma mulher, devido a sua timidez e o seu rosto que tem algumas cicatrizes do acidente que sofreu, quando tinha nove anos, e foi atropelado por uma moto.

O fato é o surgimento de uma onda de terror no município de Osasco onde Badola reside. Todo final de semana aparece uma jovem morta e estuprada. Ocorre boato nas escolas da região, que está aparecendo uma mulher morta por dia, e no local onde é achado o corpo há um recado onde diz:

“FOI MAIS UMA MAIS AINDA FALTA 150”.

Apenas fofocas. O que confirma as mortes no município são os B.Os. que estão sendo registrados na delegacia local.

Foram três meses de medo no município, até que Samantha, uma jovem de 20 anos que foi estuprada, mas conseguiu escapar com vida, deu queixa na polícia e descreveu o rosto do maníaco para o retrato falado.

Para a senhora Carraro a decepção foi grande quando a polícia irrompeu em sua casa atrás do filho mais velho. Mas Badola já havia se prevenido. Só agora sua mãe descobriu que as roupas que ele havia colocado numa sacola, não era doação como Badola falou naquela manhã quando saiu dizendo que ia na associação dos moradores do bairro para doar as roupas.

Duas viaturas com quatro policiais ficaram de plantão na frente da casa da senhora Carraro por três dias seguidos. A intenção era a de prender Badola se ele voltasse para pegar algum pertence, e de evitar a invasão da casa pela população furiosa com as atitudes do filho-da-puta do Badola.

Houve uma movimentação muito grande de viaturas da polícia durante dois meses seguidos na região. Até por que, uma das 14 jovens mortas pelo estuprador, era a filha de um comandante da Polícia Militar.

Mas todos os esforços foram em vão, Badola estava morando na casa do tio em Campinas e não pretendia voltar para Osasco, tanto que arrumou um emprego e voltou a estudar, mas por disfarce do que por afinco, pois a escola era sempre a mesma merda para ele: três ou quatro dezenas de alunos sentados com o cu nas cadeiras, enquanto um superior fica rabiscando a lousa e falando coisas que não chamam a atenção de ninguém.

 O medo e a precaução são tão grandes que ele mudou totalmente o visual: cortou o cabelo, deixou o bigode e o cavanhaque crescer, começou a usar óculos e mudou o estilo de se vestir. Era outro homem, pelo menos na aparência.

Mãe é mãe, diz o ditado. Apesar de estar chocada com as atitudes do filho, sempre que batia a saudade dona Carraro ia até Campinas para vê-lo.

Quatro anos mais tarde, Badola não consegue esconder sua curiosidade para saber como anda o bairro onde morava, se ainda falam dele, se a polícia ainda esta á sua procura, entre outras perguntas que demonstram o seu interesse em voltar. E foi o que fez alguns meses mais tarde.

Chegou num dia chuvoso no meio da noite. No dia seguinte ainda conseguiu se manter dentro de casa, por sua própria vontade e pelo pedido de dona Carraro, que está atenta ao risco que o filho corre, mas também está feliz por tê-lo por perto.

Nos dias seguintes ele começou a ficar em frente ao portão de sua casa após ás dez da noite para ver as pessoas que voltam da escola ali perto.

Duas semanas depois ele já saía de noite com um vizinho que mudara para ali há alguns meses e não sabia dos seus atos.

A felicidade de Badola é enorme. Quase ninguém se lembra dele, os que lembram estão de bico calado. Assim pensa ele.

Começou a andar na rua sem a atenção que adotou há alguns anos atrás. Voltou a freqüentar os bares do bairro e a ficar até altas horas da madrugada na rua.

Esqueceu-se do que fez no passado.

Sempre chegava em casa entre cinco e seis da manhã. Mas houve o dia em que ele se atrasou. Quando chegou já era noite. Veio dentro de um caixão vermelho escuro, carregado pelos funcionários da funerária.

Vinte pras onze da noite. Dona Carraro derrama seu sofrimento pelos olhos, enquanto é consolada pelas amigas. Em volta do caixão, alguns amigos e curiosos. Lá fora a garoa fina cai, sobre a cabeça das pessoas que voltam da escola.

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