Sentados em volta de uma mesa, com um logotipo de uma famosa marca de cerveja estampado, estavam o Doda, o Pinha e o Plínio, dono do bar. Havia mais de uma hora que, Doda e Plínio, ouviam, assustados, às pretenções do Pinha, um rapazola de 20 anos, que dissera haver bolado um plano infalível que lhe renderia boa fama entre a rapaziada do bairro.
Entre um copo de cerveja e outros tantos, Pinha falara aos amigos que pretendia ir aos Estados Unidos assassinar nada menos que o Presidente Bush.
- O cara se sente, acha que é dono do mundo... Vou lá e meto dois tiros na cara dele e... já era, tá feito.
Plínio, um senhor já na casa de seus quarenta e seis anos, alertava o rapaz sobre a impossibilidade daquele plano dar certo:
- Impossível, garoto. Primeiro que para você viajar, é obrigatório tirar o passaporte, e o visto então... Os homens lá, depois que o Bin Laden derrubou os prédios, não concedem visto nem para o Papa.
Após dar um generoso gole no copo de cerveja, Pinha, com um sorriso despreocupado e seguro no rosto, disparou aos dois companheiros de mesa:
- Tenho meus contatos. Vocês pensam que eu sou bobo, mas não sou. Consegui fazer amizade com um cara lá de dentro do consulado, quando trabalhava de boy na agência. Ele me disse que o cônsul americano é corrupto e que só preciso molhar a mão dele e... Já era, pego o avião e mato o homem.
Doda, com a cabeça completamente zonza devido ao abuso etílico, indagou o decido garoto:
- Tá bom, na teoria é fácil. O que eu quero ver é a prática. Para começar você não tem grana nem para pagar essas garrafas de cerveja aqui desta mesa. Depois, como é que você vai se virar lá meu? Você pensa que Estados Unidos é periferia de São Paulo? No momento em que você sair do aeroporto a cidade te engole, rapaz. Pare de sonhar asneiras.
Pinha insistia dizendo que cidade é tudo igual, que quem consegue viver no extremo sul de uma metrópole como São Paulo, vive em qualquer parte do mundo. E, além do mais, ia ser por pouco tempo. Uns três dias, no máximo. Era só o tempo de estudar como funcionava o sistema de segurança da Casa Branca, essas coisas bobas...
- Já tenho um mapa da Casa Branca. Copiei de um filme que assisti na semana passada. Vai ser moleza, vou pegá-lo às cinco da tarde.
Seu Plínio ficou curioso em saber o porque do horário religiosamente exato, Pinha respondeu:
- É que, no filme, o Bush recebia um serviçal todo dia às cinco, que lhe levava uns comprimidos para ele tomar. E deve ser a mesma coisa, porque fazer o que ele faz, essas guerras aí, ele deve ser maluco mesmo. Por isso, a necessidade de tomar remédio controlado.
Quanto ao dinheiro para a viagem, Pinha dizia que já havia esquema pronto.
- Meu primo é caixa da loteria da rua de baixo. Amanhã à noite, vou passar por lá e pegar a grana que ele tá desviando desde o mês passado. Aí, é só pedir para a Aninha da agência trocar lá na casa de câmbio por dólar americano. Pronto, tá feito.
O Doda, zonzo, não prestava mais atenção na conversa. Seu Plínio olhava para o rosto do rapaz ficava impressionado com cada relato a respeito do fenomenal plano. Quanta imaginação! Pensava ele. Que esse moleque fosse estranho ele sabia, era mesmo, agora, ficara sabendo que ele era doido também.
Lá pelas tantas, Pinha olhou a hora no relógio que, fica em cima do freezer do bar, e avisou os outros dois que precisava ir. Tinha que dar os últimos acertos no roteiro da ação. Engoliu o resto da cerveja que pairava no fundo do seu copo e se levantou para sair.
Neste exato momento, estacionou em frente ao bar, uma limosine de cor preta, com todos os vidros escuros. O vidro do lado do passageiro abaixou lentamente, um homem encapuzado se apoiou na porta do veículo, empunhou uma metralhadora – destas que a gente costuma ver nos filmes americanos – e metralhou os três homens dentro do bar. O carro manobrou e saiu rápido do local.
No bar, ficaram estendidos sobre a mesa, o Doda, bêbado; o Plínio, com um aspecto de pavor na face; por fim, o Pinha que, no momento que percebeu que iria morrer, tirou, do bolso, uma foto do Saddam Husein e, com ela, ficou junto do peito que havia, também, mais trinta furos de balas.
São Paulo, 17 de maio 2005.