César fora encarcerado há vários anos, caiu nas garras do sistema. E, como não seria diferente, sofre com as agruras de uma política, por si só, excludente. Encontra-se, ao presente momento, em uma das muitas penitenciárias do estado de São Paulo, refém, como milhares de outros, das improdutivas políticas governamentais a - simplesmente - aniquilá-lo não apenas como pessoa, mas, acima de tudo, como cidadão.
E a história, uma vez mais, se repete. Vida partida, dificuldades as mais variadas e, principalmente, falta de oportunidades, embora não seja a via delituosa, por certo, o melhor caminho à resolução destes conflitos, no entanto, um iminente risco.
Neste instante, César aguarda a tão sonhada e aguardada liberdade, já prometida há vários meses, mas que, devido a idas e vindas burocráticas de intermináveis papéis, o impedem de retornar do verdadeiro inferno. Dependente, também, da insensibilidade de alguns operadores que, não raro, se esquecem (talvez façam questão disto...), que por detrás de cada preso existe um ser humano e uma família e que, quando solto, ainda terá de suportar as já rotineiras distinções prontamente estabelecidas pelo terrível meio em que vivemos. Tal como no célebre escrito de Victor Hugo, Os Miseráveis, em que o seu personagem, Jean Valjean, trazia consigo um desagradável passaporte amarelo, hoje, de uma maneira ou de outra, exige-se a certidão de antecedentes, devendo esta enfatizar, e, de preferência em letras garrafais, que “nada consta contra o nome informado...”.
Conheço César há pouco mais de dois anos, quando do desenvolvimento de meu modesto trabalho, hoje transformado em livro, e, desde então, comunico-me através de cartas, de duas a três por mês. Àquela data, cumpria pena na Penitenciária do Estado, no complexo do Carandiru, encontrando-se, agora, em Tremembé, longe da companheira e dos filhos, que, infelizmente, assim como tantas outras famílias brasileiras, não dispõem dos recursos necessários para visitá-lo assiduamente.
O instituto prisional, sem dúvida alguma, transformou-se num dos mais gravosos problemas sociais, em meio a penas privativas bem além da contenção da liberdade, vez que uma infinidade de outros fatores, vale dizer, direitos, também são comprometidos.
No estado de São Paulo, assim como em grande parte do Brasil, não é novidade: a superpopulação carcerária, sem contar os mandados judiciais ainda não cumpridos; a ociosidade; a falta de assistências, seja material, à saúde, social, educacional, jurídica ou religiosa; a proliferação de doenças infecto-contagiosas dentro das prisões, tais quais: a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), além da tuberculose; a incidência de abusos sexuais; a constante violação ao sigilo de correspondência, a não concessão para todos da visita íntima, ademais de outros. Em inconfundíveis dependências que mais se assemelham, com o perdão da palavra, a depósitos de gente, o que nos permite afirmar, com todas as letras, que aquele que em qualquer destes ingressa, a não ser por sua luta pessoal, sairá de lá um tanto quanto pior e, por conseguinte, não ressocializado.
De fato, caberia ao ente estatal assegurar - integralmente -, as prerrogativas então adstritas aos que em um presídio se encontram. Nunca, porém, pela condição de preso, mas, sim, pelo fato ainda mais relevante e fundamental, qual seja, o de serem eles: SERES HUMANOS! Apenas isto.
Ivan de Carvalho Junqueira, 24, é bacharel em Direito e autor do livro “Dos direitos humanos do preso”
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