Nestes tempos de Educação Continuada , fico estarrecido com a apologia que ainda se faz no Brasil em relação ao sucesso que certas pessoas, especialmente políticos e empresários, tiveram na vida mesmo sem ter estudado além do nível fundamental. A idéia que se passa aos jovens é que a educação não faz diferença para o sucesso de um indivíduo, ou seja, que a chamada “escola da vida” é o que realmente funciona. Aliam a preguiça em aprender formalmente, comum na juventude, ao descaso da sociedade em geral em relação à educação, tratando algo que é fundamental e inerente ao ser humano – o aprendizado – como algo supérfluo, aborrecido, que “não terá uso prático” na vida das pessoas.
Muitos pais querem que seus filhos estudem, a fim de obterem unicamente um pedaço de papel após alguns poucos anos de estudo formal e “exigido” pela sociedade. Esperam com isso que seus filhos tenham “uma vida melhor” que a deles. Não estão interessados nas portas que a base do saber formal pode lhes abrir, nem nas pessoas que seus filhos podem vir a ser. Através do incentivo a essas atitudes, o Brasil continua perdendo a chance de fazer a diferença num mundo globalizado. Fica à mercê de políticos e empresários desonestos, que utilizam a ignorância das massas em proveito próprio, como estamos cansados de ler, ouvir e ver nos noticiários, sem que atitude alguma seja realmente tomada para corrigir o problema. Parece que são coisas que não nos afetam, nem nos dizem respeito...
No programa Atenção Brasil , transmitido pela Cultura FM, ouvi uma entrevista do Dr. José Aristodemo Pinotti, ex-secretário da Educação de São Paulo, que dizia que “há várias crianças não alfabetizadas na 3ª série”. Meu Deus! O que estamos fazendo em relação ao nosso futuro? Como pode haver crianças não alfabetizadas se já cursaram duas séries antes? O que se faz nas escolas públicas? O que, enfim, essas crianças estão fazendo na escola para continuarem analfabetas mesmo estando na 3ª série fundamental? Por que está se jogando fora dinheiro com má educação num país como o Brasil? O que os professores dessas crianças têm a declarar diante dessa afirmação? O que seus pais acham disso? Essas questões continuam sem resposta.
No domingo 17 de setembro de 2006, no caderno nacional de O Estado de S. Paulo , uma manchete me saltou aos olhos: Taxa de analfabetismo reduz ritmo de queda no governo Lula . Nestes momentos pré-eleitorais devemos tomar cuidado com a veracidade do que é escrito, porém, o autor Fernando Dantas consegue deixar clara a crueza dessa realidade através de índices reais, obtidos de fontes tais como o PNAD/IBGE. O que me incentiva a citar sua matéria como fonte fidedigna. Segundo a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios de 2005), o analfabetismo vem registrando queda, de 1992 até 2002, de 0,5 % ao ano. Nos últimos anos essa queda ficou em 0,3 % ao ano. Ou, em termos absolutos, "havia 14,8 milhões de analfabetos em 2002 e em 2005 esse número tinha caído apenas para 14,6 milhões”. E não nos iludamos: os números são explicados apenas por variações demográficas, o que implica que esses 0,3% de redução ao ano se deve principalmente pela morte de idosos analfabetos...”É praticamente como se não houvesse alfabetização de adultos no País...” Segundo Dantas, “esses resultados estão deixando perplexo o governo, que gastou, entre 2003 e meados de 2005 um total de R$ 330 milhões para alfabetizar 3,4 milhões de adultos por meio do programa Brasil Alfabetizado .
Uma das possibilidades para explicar tal contra-senso, segundo a matéria, seria, nas palavras do secretário de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade do Ministério da Educação, Ricardo Henriques, “que o programa está atraindo muitos analfabetos funcionais, mas que não são absolutos.” O Instituto Paulo Montenegro (IPM), braço social do Ibope, define, segundo a matéria de Dantas, um alfabetizado funcional como sendo a pessoa “capaz de utilizar a leitura e a escrita para fazer frente às demandas de seu contexto social e usar essas habilidades para continuar aprendendo e se desenvolvendo ao longo da vida”. A matéria menciona, ainda, que além de não haver estatísticas precisas do número de analfabetos funcionais no Brasil, dependendo do “rigor do conceito” pode-se estimar-se um percentual de 25% a 75% dos brasileiros [!!!].
Ou seja, dependendo do critério adotado, o analfabetismo funcional brasileiro pode atingir de ¼ a ¾ da população do país ! Isso é simplesmente absurdo! Porém, torna-se lógico quando sabemos que muitos governos, desde a criação do Mobral (1967), deixavam de considerar um cidadão analfabeto a partir do momento em que o mesmo sabia “desenhar” seu nome num documento...
Hoje, o Brasil sente as seqüelas desse descaso com a educação e, diante do fracasso verificado nesses últimos 40 anos de tentativas governamentais de erradicação do analfabetismo, temo sinceramente que se apenas continuarmos mudando “os conceitos” de análise, sem jamais atacarmos o cerne, que é fazer da educação e do prazer proporcionado pelo saber os principais alicerces de nossa sociedade, o Brasil jamais deixará de ser um país de terceiro mundo, pois estará cheio de pessoas com potencial e sonhos, mas que jamais os concretizará por falta de conhecimento.
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