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Meu pai tá preso por ter matado cinco caras

Por: Marcos Lopes

Aos Meus amigos Edvan e Feijão

 

- Meu pai tá preso por ter matado cinco pessoas – dizia Carlinhos ao professor quando este indagou qual era o motivo de ter dezesseis anos e ainda cursar a sexta série – toda vez que meu pai arrumava uma treta no bairro eu tinha que sair da escola e fugir com ele. Só este ano eu estudei em seis escolas diferentes.

- E a sua mãe, o que ela acha disso?

- Já não vejo minha mãe faz mó tempão, fêssor, ela fugiu com o parceiro do meu pai.

- E com quem que você mora?

Carlinhos não tinha motivos para sorrir, contudo, naquele dia, sorriu docilmente com as perguntas do mestre. Nunca conheceu alguém que quisesse saber de sua vida, das peripécias que seu pai o fazia viver. O professor deixou seu momento de descanso de lado para saber um pouco mais da vida daquele aluno tão traquina, porém inteligente. Os outros docentes julgavam-no um garoto qualquer, não muito diferente dos outros, mas, Franklin, o professor de história, descobriu num sorriso solitário, num gesto simples e sem malícia do garoto, uma criança especial, carente de pai, mãe e amigos e que fazia aquelas molecagens toda para chamar a atenção de alguém, mostrar que estava ali e gostaria de ser notado e tratado como gente.

Carlinhos era um menino simples, sem luxo, ia pra escola de chinelas remendadas com grampo de cabelos. Seu rosto ósseo denunciava que não se alimentava direito. Uma vez confessara que só comia quando sobrava na casa da vizinha e que as Tias da cozinha da escola, lhe davam, às escondidas, sobras de merendas, mas a diretora descobriu e as proibiu. E agora comia vez não, vez não e vez sim.

Dividia, na casa de alvenaria onde morava, palmo a palmo cada pedacinho de chão com alguns detestáveis ratos. O seu cantinho não tinha nada que chamasse a atenção de alguém, exceto pelo vazio e pela foto da família –seu pai e sua mãe – centrado em cima de uma lata enferrujada de leite em pó, que ficava na cabeceira do colchão que pescara na última enchente de Agosto. 

Deitado em seu leito macio Carlinhos pensava na figura do pai, da mãe, tentava entender o por quê de tudo aquilo estar acontecendo com ele. Com apenas dezesseis anos tinha que se manter, caçar o que comer como fazem os leões da selva. Uma vez a professora levou um vídeo que mostrava como os animais selvagens se viravam para comer. Identificou-se ao ver um leãozinho sendo deixado pela mãe para sozinho aprender a caçar e quando este leão cresceu tornou-se o animal mais perigoso e mais respeitado na selva.

Chegava, em algumas noites, sonhar sendo abraçado pelos genitores. Não se sentia muito diferente dos garotos da escola, afinal, muitos nem tinham um pai para sentir saudades, pelo menos ele sentiu, há muito tempo atrás, o cascudo paterno. Como doía.

Uma vez a diretora convocou o responsável pelo garoto e disse que se ninguém comparecesse ele ficaria duas semanas sem entrar no colégio. Seriam duas semanas de fome. Carlinhos implorou para a vizinha comparecer e depois de insistir muito ela aceitou dizendo que aquela seria a quinta e a última vez que intercederia por ele.

- Espero que cê não tenha bancado o predador novamente e roubado o lanche de ninguém como fez das últimas vezes.

Dito é feito. Era justamente por este motivo que o garoto recebeu a convocação. A diretora falava feito um papagaio. Dizia que o garoto era um morto de fome, que os pais o abandonaram – ela não sabia a verdade – por ele ser assim; desobediente e faltava com as suas obrigações. (estou suavizando o que foi dito para a vizinha, pois, ela não entendeu uma virgula do que a diretora lhe disse).

Ansioso Carlinhos esperava do lado de fora da sala para saber se já poderia ir à escola naquela tarde.

- Ela disse que cê pode vim pra escola hoje.

- falou alguma coisa sobre o lanche –perguntou ele coçando a cabeça.

- Disse que você tem que melhorar seu comportamento, senão vai ser colocado pra fora da escola.

Que felicidade! Poderia lanchar sossegado naquela tarde de sexta-feira. 

A chuva castigava os moradores da viela onde Carlinhos morava, o vento forte e o céu escuro transformavam o ambiente num cenário de filme de terror, Carlinhos apanhou uma lata e a colocou embaixo da goteira que havia em cima de sua cabeça. Ao ensaiar pegar algo para ler, uma voz desesperada chamou por seu nome. Ele abriu a porta rapidamente e recebeu a notícia de que a vizinha estava tento um troço, saiu correndo viela a baixo para socorrer aquela que lhe arrancou dos braços da fome dezena de vezes. A casa da vizinha estava sequinha, nem um pingo d´água no chão, enquanto a dele, parecia que o oceano havia transbordado por lá.

Carlinhos nunca havia visto uma cena daquela; a vizinha se retorcia e sua boca espumava, parecia um cão raivoso. Não se sabe de onde aquele garoto franzino tirou tanta força para levantar aquela mulher tão pesada. A viela parecia uma cachoeira; a água descia numa velocidade impressionante, talvez isso tenha ajudado-os a descer aquele monte de escadas tortas.

- Seu Pedro – gritava desesperadamente enquanto segurava a vizinha – me ajuda aqui, ela tá batendo as botas. Rápido!

O velho da quitanda, que já não tinha tanta força, somente abriu a porta da perua. O garoto fez o resto do trabalho.

No hospital, seu Pedro disse que não poderia deixar a quitanda sozinha e incumbiu Carlinhos de ficar ali até chegar algum parente dela. Enquanto a vizinha fora levada às pressas para UTI ele ficou sentado no banco, tremendo de frio. Não demorou muito e logo chegou o segurança dizendo que ele deveria esperar do lado de fora, pois, estava todo molhado. Carlinhos não retrucou com o negão e foi se sentar lá fora. Seu corpo tremia e seus dentes batiam freneticamente uns nos outros. Um policial militar que passava perguntou o que ele fazia ali, ao ouvir toda a história este o conduziu para dentro da Unidade Médica.

- Se alguém lhe mandar para fora – disse o policial – você nos chama.

- Tudo bem – respondeu olhando firme para o negão.

Estava tão entretido com a tevê que nem viu a hora passar. Um médico saiu pela porta donde entrara a vizinha e perguntou quem a acompanhava.

- Sou eu, dotô.

- O que você é dela?

Depois ficou pensando o por quê de ter dito aquilo, mas na hora respondeu que era filho.

- Ela ficará em observação e não poderá ir pra casa, se você quiser pode ir e lhe trazer, amanhã, algumas peças de roupas.

“Andar tudo isso, pensou Carlinhos, prefiro ficar por aqui mesmo”. E assim fez. Aconchegou-se num dos bancos de espera e ali ficou até que o marido da vizinha chegasse.

Chegou acompanhado de uma linda garota. Estava desesperado. Foi até o balcão de informação e se acalmou ao saber que sua esposa estava fora de risco graças ao garoto que lhe socorrera. Ao olhar para trás viu Carlinhos todo encolhido, ainda com a roupa molhada colada no corpo. Aproximou-se. Pegou nas mãos tremulas do garoto e lhe agradeceu:

- Poxa, moleque, brigado pela força hein.

Carlinhos se sentiu importante, talvez pela primeira vez na vida, prestara para alguma coisa que não fosse comer. Por falar em comer, sua barriga roncou como um trovão. Ele sorriu e seu Júlio – o marido da vizinha – lhe convidou para lancharem na padaria que havia ali em frente.

A garota os acompanhou calada. Na padóca, sentou-se ao lado do marido da mãe que lhe abraçou carinhosamente. Seus cabelos bonitos pareciam os de uma modelo, dessas que vemos na tevê toda hora, só que mais bonito. Seu rosto de boneca possuía uma pequena pinta do lado esquerdo quase perto do nariz. Estatura mediana e perna fina, porém, muito elegante ao andar com aqueles imensos saltos.

Carlinhos estava com tanta fome que nem reparou o quão era bela a garota que estava a alguns metros dele. Uma mulher bonita odeia quando não é notada, quando não recebe elogios então; fica uma fera. Sente-se, por muitas vezes, superior às outras pessoas devido a sua formosura, quer ser o centro das atenções, mas com Carlinhos foi diferente, em sua frente havia um enorme e delicioso hambúrguer que ele devorava sem prestar atenção no que havia ao seu redor.

A garota era insistente e fazia de tudo para chamar, em vão, a atenção do garoto que perguntou se poderia comer mais um.

- Quanto mais você quiser – respondeu seu Júlio impressionado com o apetite daquele ser raquítico que estava ao seu lado. 

A vizinha teve derrame. Já não era mais aquela mulher forte que levantava todos os dias as seis da matina para pegar o ônibus lotado e ir faxinar a casa dos dondocas lá no Alto de Pinheiros. Sua mão esquerda perdeu parte dos movimentos, seu riso deixou de ecoar nas vielas onde morava, uma bengala feita com cabo de vassoura agora era sua inseparável companheira.

Depois que ela saiu do hospital, nunca mais Carlinhos foi com fome e de chinelos para o colégio, suas camisas agora eram engomadas e seu tênis, embora fossem velhos, chamavam a atenção da molecada.

A filha da vizinha viera somente para passar alguns dias e teve que ficar para cuidar da mãe, apesar desta insistir para que voltasse a Pernambuco, a garota foi inexorável em sua decisão. 

Depois que seu pai foi preso, Carlinhos nunca mais precisou mudar de bairro, gostava dali e já contava quatro anos desde que chegara. Após ter feito supletivo concluiu o ensino médio e procurava um emprego desesperadamente, a única coisa que encontrara foi um bico numa construção de um restaurante na Faria Lima. Não pagava muito, mas dava ele pra se virar.

Por ser um exímio ajudante de pedreiro, nunca mais lhe faltou trampo. 

De uns tempos pra cá, a viela passou a ser freqüentada por pessoas estranhas, era um sobe e desce desgraçado de gente que não morava ali. Lá no topo da viela, onde passou a ser chamado, não sei por qual motivo de torre, ficavam dois branquelos azedos. Uma pessoa subia, cumprimentava-os e descia com o sorriso lá na orelha. Todos os dias eram a mesma coisa, no fim de semana então o movimento dobrava; era gente que não acabava mais, até policia, que não era muito de freqüentar a viela, passou a freqüentar. Subia, cumprimentava os branquelos e descia.

- Tá olhando o quê, neguinho filho da puta – perguntou o policial – perdeu alguma coisa.

Carlinhos apenas baixou a cabeça e entrou sem dizer nada.

Uma vez viu a filha da vizinha de papo com um dos branquelos e a questionou:

- O que acontece ali pra cima?

- Você não sabe – perguntou ela irônica.

- Não, há muito tempo que vejo este movimento ai, mas não sei o que é.

Ela sorriu e logo confirmou que ali havia se formado uma biqueira, ou seja, um ponto de drogas. Agora tudo fazia sentido; o sobe e desce, os policiais, o nome torre.

- E você fica se envolvendo com esses marginais. Sai dessa Thaís, você é uma garota bonita, inteligente, tem pai e mãe, não precisa disso ai não.

- Achei que você não tinha notado minha beleza – disse ela rindo dos conselhos do órfão.

- O que adianta ser bela e ter cabeça de anta?

Ela ficou furiosa. Quis ir pra cima dele, mas se conteve.

- E ai, delícia – gritou um dos soldados se referindo a Thaís – você não vai querer dar um peguinha não? Deixa este jão ai e cola cum nóis

- Não conta nada pra minha mãe viu –ordenou ela ameaçando correr de encontro com aquele que lhe chamou – senão cê vai ver.

Carlinhos apenas balançou a cabeça em sinal de negativo e desceu sentido à padaria.

Sentiu ímpeto de contar tudo para a vizinha, mas, resolveu que era melhor deixar a garota fazer o que quisesse da vida dela, afinal, Deus deu a vida pra cada um cuidar da sua.

O sol de domingo estava escaldante, a agitada viela agora tinha festa quase todos os fins de semanas. A fumaça do churrasco espalhava o cheiro da carne por toda a vizinhança. Até um boteco fora aberto. O som ensurdecedor tocava a famosa música“Tô ficando atoladinha”. Algumas garotas, de shots curto, mostravam a polpa da bunda, desciam até o chão quando a música mandava. Outras punham a mão no chão, empinavam o bumbum e começavam a sacudi-lo em ritmo voluptuoso.

Carlinhos chegava do trabalho quando presenciou a vizinha ralhar com sua filha, dizia para ela, com dificuldades, pois, depois do derrame não conseguia mais falar normalmente, que não a queria junto daqueles marginais. Lá da torre eles somente observavam. Carlinhos passava na hora da discussão e acabou sendo chamado de cagüeta:

- Ai tá ele – gritava a garota apontando o indicador – Ai tá o safado que fica cuidando da vida dos outros. Aposto que é você quem chama a policia todas as noites pros caras da torre. Por que cê não se fode seu órfão do caralho? Vai procurar um pai e uma mãe seu arrombado. Eu quero que você morra, filho da puta.

As acusações de Thaís fizeram-se mais alto que a música que agitava a galera. Os soldados se entreolharam e um deles desceria se o outro não o impedisse. 

A noite cobria a viela com seu véu de neblina. As estrelas ofuscadas mal podiam ser vistas, a lua, lá longe, parecia tristonha e o nevoeiro misturava-se com o cheiro insuportável da maconha.

Carlinhos não conseguiu dormir. Ficou pensando nas palavras cortantes que Thaís proferira. Sentiu saudades do pai, da mãe. Há quanto tempo não os via, que não sabia notícia. Só recebera uma só carta; a do pai. Tinha certeza de que seu pai estava vivo, já a mãe... As lágrimas quentes lavaram seu colchão velho, os soluços quebraram o silêncio. Não lembrava mais a fisionomia materna, tinha como recordação somente aquela foto antiga que guardara por muito tempo, talvez se naquele momento esbarrasse com a ela por ai, certamente não a reconheceria. Guardava, na carteira, a única carta que recebera de seu pai e a lia com saudades sempre que aquela angustia teimosa ousava lhe incomodar. A carta dizia exatamente assim:  

“Olá, filho querido como é que cê tá, muleque, tá istudando? Rezo todos os dia pra Deus não deixar você fazer coisa errada. Us homi da lei tirou a liberdade do pai mas daqui uns dia vou tá na rua com você novamente e ai vamus podê ir lá no Mc Donald pra nóis comer aquele lanche que você tanto me pedia. Tá lembrado? Ó as coisa aqui na cadeia não é fácil não, todo mundo quer comer todo mundo. Até pra ir no banheiro tem que pedir licença. Nunca faça coisa errada pra um dia cê num vir parar aqui ou então morrer na mão de um idiota. O pai alugou um barraco no inferno onde o pagamento diário é o seu sofrimento. Espera o pai ai., Logo, logo vamus tá junto di novo e ninguém vai separar nóis. Beijos e fica com Deus, filhote

Assinado: Carlos Eduardo da Fonseca. 
 

Os fogos do lado de fora indicavam que novas drogas haviam chegado. Não demorou muito para ouvir passos apressados e cochichos de usuários.

- Aê, irmão –dizia um nóia – vende seis papel ai pra mim.

- Cê liga quem aqui, jão –perguntou um dos soldados desconfiado do nóia.

- Ligo ninguém não, tiozão. Um maluco ali do bar que falou que aqui tinha uns barato da hora.

O soldado que atendia seu cliente indicou com a cabeça para que outro soldado trouxesse a droga. Ao entregar a mercadoria o nóia anunciou a prisão e um monte de policiais adentraram a viela dando tiro e tudo.

Um dos branquelos escapou pulando o muro que dava pra rua de cima, já o outro agonizava no chão enquanto mais alguns, disparavam contra os policiais de cima de uma laje. No outro dia a impressa veio xeretar o que havia acontecido e noticiou que; “policiais heróis desfizeram uma bocada, prendendo o dono da boca que fornecia drogas para toda a região e matando um soldado”.

A paz voltou a reinar na viela e seu Júlio, até deu uma festa. Thaís olhava com desprezo para Carlinhos, achava que ele foi quem lhe dedurara para sua mãe. Ele até tentou convencê-la de que não era a cara dele fazer aquele papel, mas, ela não lhe deu crédito. 

- Aê Carlão – falava ao celular um dos branquelos que conseguiu escapar – cê viu o que aconteceu, mano sentaram o dedo no Rodrigo e tomaram a biqueira.

- Caralho, mano – dizia o patrão de dentro da cadeia – cês também não servem pra porra nenhuma hein! E as drogas?

- Os homi levaram tudo, não sobrou nada. Mas eu tô ligado quem é o filho da puta que entregou nóis e...

- O desgraçado já tá morto?

- ainda não, mas...

- Mais é o caralho!!!! Tô falando que esses malucos não servem pra nada –comentou Carlos com um colega de cela – então senta o pau neste filho da puta, mano. Se até amanhã ele não tiver morrido eu mando matar você arrombado.

Sem mais argumento. Carlos era um cara de atitude e não deixava esses tipos de coisas passarem batidas, se o branquelo não matasse Carlinhos ele morreria. Era só uma questão de tempo, afinal, os policiais estavam sempre rondando a viela.

Carlinhos conseguiu provar que não fora ele o cagüeta e até já tinha outras intenções para com Thaís que sempre se fazia de difícil.

- Seria uma honra ter você como genro – disse a vizinha ao saber que ele estava interessado em sua filha – mas o que ela diz a respeito.

- Sei lá, ela sempre foge do assunto, acha que a senhora não aprova.

A vizinha caiu na risada e quando a garota chegou foi logo a questionando:

- Por que cê acha que eu não deixaria você namorar o Carlinhos?

Thaís ficou corada e respondeu em seco:

- ah, mãe – disse ela naquele jeito tímido e peculiar em movimentar os cabelos – não sei, a senhora é sempre tão séria e...

- Filha, o que eu não quero é ver você se envolvendo com pessoas erradas, o Carlinhos sempre se mostrou ser um bom sujeito, ele trabalha e é muito responsável.

O casal se olhou e deixou escapar um apaixonado sorriso. Thaís gostou de Carlinhos desde o dia em que o viu, talvez pelo desinteresse que ele mostrou por ela. Confessara que ficava com os traficantes só para ver se ele a notava. E foi a partir deste dia que os dois começaram a namorar e a fazerem planos.  

A cela fria da cadeia trazia o sorriso gostoso de seu filho, de repente Carlos acordou sentindo uma saudade desesperadora daquele cujo sangue corria em suas veias. Levantou, pegou papel e caneta e começou a lhe escrever uma carta. As lágrimas brotaram dos seus olhos e, depois de muitos anos, ele chorou... 

Carlinhos estava feliz, pois, descobrira naquela noite que Thaís era a mulher da sua vida. Foi para casa saltitando de felicidades. Nunca havia se sentido daquele jeito antes, uma onda de calor o tomou de repente, sentiu o corpo formigando como se algo o tivesse atravessado, as pernas tremeram e, sem forças para manter-se de pé, caiu com a cara no chão feito chumbo. Tentou se virar, mas, sem êxito. O branquelo apareceu sorrindo.

- E ai, cagüeta – disse ele apontando uma 380 na direção da cabeça de Carlinhos que movimentava a boca sem conseguir nada falar – o Carlos mandou isso aqui pra você.

E descarregou os outros dezoito tiros restantes pelo corpo do garoto. Ao ouvir seqüentes disparos, os curiosos puseram-se para fora de suas casa e ao vêem um corpo estirado foram ver de quem se tratava. Gritos desesperadores fizeram-se ouvir, não só pela viela, mas por todo o bairro. Thaís ainda conseguiu ver o autor dos disparos dobrar a esquina. O resgate chegou cedo; seis e vinte cinco da manhã quando o corpo do nosso herói já estava sem vida...

A carta de Carlos não pôde ser entregue, na observação dos correios viera descrito “Destinatário não existente”. 

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Marcos Lopes 
 
 
 

 

 

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